sexta-feira, 11 de abril de 2008

- Veja os erros mais frequentes no conceito de probabilidade

José Luiz Pastore Mello*Especial para a Folha

Caro leitor, trataremos hoje de um dos equívocos mais frequentes a que o conceito errado de probabilidade nos pode induzir.

Você já deve ter visto um jogo em que uma pessoa esconde uma bolinha embaixo de uma tampa e, em seguida, ao trocar várias vezes a posição desta com duas outras vazias, convida alguém a apostar onde está escondida a bolinha. Quando o condutor do jogo percebe que sua freguesia não está muito disposta a apostar, é comum que aponte alguém da platéia pedindo um palpite sem o compromisso de uma aposta.

Depois do palpite, o condutor do jogo levanta uma das tampas vazias e diz ao candidato a apostador: "Uma vez que levantei uma tampa vazia, suas chances de vencer aumentaram de 1/3 para 1/2, que tal apostarmos algum dinheiro agora?". Arriscar uma aposta numa situação dessa sempre reserva uma dolorosa surpresa: a derrota sempre estará mais próxima do que a vitória.

A explicação para isso é que o argumento usado pelo condutor do jogo foi elaborado de maneira ardilosa para induzir o apostador a arriscar seu dinheiro. Uma vez escolhida uma entre três tampas, o fato de outra ser ou não levantada não interfere na chance de vitória do apostador, que continua igual a 1/3. Como o golpista sabe exatamente onde está a bolinha, logo após o apostador escolher uma tampa, sempre será possível levantar outra que esteja vazia. O golpe consiste em convencer o apostador de que, de fato, sua chance de vitória aumentou em 50%.

Golpe muito parecido com esse ocorre em programas de auditório em que o apresentador pede a uma pessoa da platéia que escolha uma entre cinco portas fechadas (apenas uma contém um prêmio). Após a escolha, o apresentador, que sabe exatamente onde está o prêmio, abre três portas vazias e diz ao apostador: "Sua chance de ganhar, que era de 1/5 (20%), agora, com apenas duas portas abertas, passou para 1/2 (50%)".

Mesmo em situações em que o apostador da platéia tenha algo a perder, é comum que o argumento viciado do apresentador o induza a arriscar tudo na aposta. Na prática, uma vez escolhida uma porta, o fato de outras três serem ou não abertas não interferirá na chance de êxito, que continuará sendo igual a 20%. Fique atento e não caia você na falácia do jogador no vestibular, tampouco na vida.

*José Luiz Pastore Mello é mestre em ensino de matemática pela USP e professor do Colégio Santa Cruz


- Saiba quando usar a regra de Cramer

José Luiz Pastore Mello*Especial para a Folha

A discussão de métodos para a resolução de sistemas de equações é assunto bastante freqüente na matemática escolar. No ensino fundamental, resolvemos sistemas por substituição de variável ou por adição de equações, ao passo que, no ensino médio, aprendemos a resolvê-los pela regra de Cramer (com cálculo de determinantes) ou por escalonamento. A regra de Cramer, que por vezes tem sido mais discutida e praticada do que o método de escalonamento, constitui procedimento bastante inadequado para a resolução de sistemas com muitas equações e incógnitas. Façamos algumas contas para tornar essa idéia mais transparente.

Lembremos que, para resolver um sistema linear de n equações e n incógnitas por Cramer, temos de calcular n+1 determinantes de matrizes quadradas de ordem n. Se quisermos resolver cada um desses determinantes pelo desenvolvimento de uma linha (ou coluna) usando o teorema de Laplace, seremos obrigados executar um determinado número de somas e de multiplicações. Observe a tabela abaixo com indicações do número de multiplicações (M) e de adições (A) necessárias para calcular o determinante de uma matriz escolhendo uma linha e aplicando o teorema de Laplace. (veja quadro abaixo)





Se você tiver uma calculadora na mão e alguma paciência, poderá conferir que o determinante de uma matriz 20x20 exigiria um total de multiplicações e adições da ordem 6.1018.Estimando em 3,6.µs, (3,6.10-6) o tempo gasto por um computador para realizar uma operação aritmética, o cálculo do determinante de uma matriz 20x20 feito dessa forma por uma máquina levaria cerca de 700 mil anos. Observando que a resolução de um sistema linear de 20 equações e 20 incógnitas por Cramer exige 21 cálculos de determinantes, levaríamos 15 milhões de anos para resolvê-lo com um computador.


*José Luiz Pastore Mello é mestre em ensino de matemática pela USP e professor do Colégio Santa Cruz


- Módulo mostra o valor absoluto de um número


José Luiz Pastore Mello*Especial para a Folha

Analisando a prova de matemática da Fuvest realizada na primeira fase de 2000, podemos avaliar quais os conteúdos que não foram abordados e que poderão servir de roteiro para o início de uma revisão preparatória para a segunda fase.

Esses conteúdos são: inequações em geral, módulo, matrizes, determinantes, discussão de sistemas lineares, exponenciais e probabilidade. Examinaremos os procedimentos algébricos para a resolução de equações modulares simples.


Se meu saldo bancário é de -R$ 200 e o seu, de -R$ 100, quem deve mais dinheiro ao banco? Sem a menor dúvida, minha dívida é maior que a sua, mas por que aprendemos com a ordenação dos números inteiros que -200 é menor que 100?


Ocorre que, na situação do saldo bancário, não estamos interessados em ordenar os números -200 e -100, mas, sim, em compará-los em valor absoluto, ou seja, em "tamanho". Para resolver problemas em que queremos comparar dois números sem levar em consideração o seu sinal usamos a notação: - 200 0= 200 (lê-se: módulo de -200 é igual a 200).

Definindo ainda que o módulo de um número positivo é o próprio número, temos que 200 = 200. Vejamos alguns exemplos para tornar isso mais claro. Qual seria a solução da equação x = 5? Como definimos -5 = 5 e 5 = 5, segue que x pode ser 5 ou -5.

E a solução da equação x -3 = 8? Fácil: basta impor que x - 3 seja igual a 8 ou que x - 3 seja igual a -8, o que resulta em x = 11 ou x = -5.


Veja que dentro das barras que representam o módulo podemos colocar diversas expressões, mas a mecânica da resolução será sempre a mesma. Fique atento, porque uma equação modular pode não ter solução, como é o caso das equações x + 1 = -3 e x + 2 = x.

No primeiro exemplo, a equação não tem solução porque o módulo de um número não pode ser igual a um número negativo. No segundo caso, como procedimento para resolver a equação, deveríamos impor que x + 2 = x ou x + 2 = -x, mas a primeira equação não tem solução, e a segunda tem uma inválida (x = -1), pois esse valor de x implicaria 1 = -1, o que não existe pelo mesmo motivo do primeiro exemplo.


Veja outra equação modular que sugere uma mudança de variável: x² + 2 x-15 = 0. Se mudarmos a variável x para y, teremos a equação quadrática y2 + 2 y - 15 = 0, cujas soluções são y = 3 e y = -5. Fazendo a volta da variável teremos: x = 3, que implica x = 3, e x= -5, que não possui solução. Segue que as únicas soluções da equação são 3. Deixaremos as inequações modulares para um outro artigo.

*José Luiz Pastore Mello é mestre em ensino de matemática pela USP e professor do Colégio Santa Cruz


- Determinante é um número associado a uma matriz quadrada

José Luiz Pastore Mello*Especial para a Folha

Quase toda aula introdutória sobre determinantes se inicia com a célebre frase: "Determinante é um número associado a uma matriz quadrada, vamos aprender a calcular um determinante ...".


Poucas aulas depois, você já está sabendo calcular determinantes de matrizes 2x2, 3x3 (regra de Sarrus) e até de uma matriz nxn (teorema de Laplace) sem ao menos ter entendido direito qual o significado do tal "número associado a uma matriz". Será que podemos dar alguma interpretação para esse número?


Um determinante de uma matriz 2x2 pode ser interpretado como a área orientada de um paralelogramo. Entendemos por "orientação" um determinado sentido na escolha da ordem dos lados do paralelogramo para compor a matriz 2x2 (sentido horário ou anti-horário).


Na figura acima, escolhemos o sentido anti-horário de orientação a partir do ponto P(1,2). A matriz 2x2, cujo determinante será a área orientada desse paralelogramo, terá sua primeira coluna formada pelas coordenadas do ponto Q do paralelogramo "em relação" à origem da orientação, ou seja, em relação a P(1,2). A segunda coluna da matriz será formada pelas coordenadas do ponto R, também em relação à origem P(1,2):


No mesmo sentido de orientação, poderíamos também calcular a área do paralelogramo usando os pontos R e S em relação ao ponto P(1,2):


Usando um sentido de orientação contrário ao adotado, obteríamos o mesmo valor para o determinante, porém com sinal trocado. Podemos dizer então que, em valor absoluto, o cálculo do determinante de uma matriz 2x2 está associado à área de um paralelogramo.


No caso de uma matriz 3x3, pode-se demonstrar usando álgebra linear que o determinante da matriz está associado ao volume orientado de um paralelepípedo.

*José Luiz Pastore Mello é mestre em ensino de matemática pela USP e professor do Colégio Santa Cruz


- Confira a diferença entre média aritimética e geométrica

Antonio dos Santos Machado*Especial para Folha de S.Paulo
Nos dois últimos anos o faturamento de uma empresa cresceu 22,5% no primeiro e 60% no segundo. Em média, quanto cresceu por ano? Ao responder essa questão, muitos pensam na média aritmética: (22,5% + 60%)/2 = 41,25%


Será que se o crescimento tivesse sido de 41,25% a cada ano, teria produzido o mesmo efeito? Pois é esta a questão que se coloca quando se pede uma média: deve ser o número que, colocado em lugar de cada número dado, produz o mesmo efeito que aqueles produziram.


Partindo de um faturamento de R$ 100, um aumento de 22,5% o eleva para R$ 122,50 e, sobre este último, um aumento de 60% o eleva para R$ 196. Repetindo o raciocínio com a média aritmética, os R$ 100 aumentados de 41,25% viram R$ 141,25, que aumentados novamente de 41,25% viram R$ 199,52 -portanto não chegando aos mesmos R$ 196.


E como resolver a questão? Que média devemos calcular?Veja: partindo de 100 multiplicamos por 1,225 (que é 1 + 22,5%) e depois por 1,60 (que é 1 + 60%) para chegar aos 196.


O que precisamos descobrir é uma taxa t (taxa média) de modo que partindo de 100 e multiplicando por (1 + t), depois novamente por (1 + t), cheguemos aos mesmos 196. Daí, o que queremos é descobrir t na equação (1 + t) (1 + t) = 1,225 x 1,60, ou seja, (1 + t) é a média geométrica de 1,225 e 1,60.


Extraindo a raiz quadrada em ambos os membros da equação obtemos 1 + t = 1,40, logo a taxa média é 40%. Confira: partindo de R$ 100, um aumento de 40% eleva para R$ 140 e com outro aumento de 40% chegamos aos R$ 196.


Recordemos: média aritmética de n números é a soma dos n números dividida por n; média geométrica de n números positivos é a raiz enésima do produto dos n números; média harmônica de n números não nulos é o inverso da média aritmética dos inversos desses números; média ponderada de n números é a soma dos produtos de cada número pelo seu peso, dividida pela soma dos pesos.


Na primeira fase do campeonato brasileiro de futebol de 1998 cada equipe realizou 23 jogos; em 1999 foram 21 jogos. Pelo regulamento deste ano, seria rebaixado o clube que tivesse a menor média de pontos nos dois campeonatos, assim calculada: 1º) toma-se a média de pontos por jogo de 1998 e a de 1999; 2º) calcula-se a média aritmética dessas duas médias. Por esse critério, um jogo de 1999 tem peso maior do que um de 1998. Por quê?


(Ao descobrir tal fato, cartolas de clubes ameaçados pelo rebaixamento já falavam em "reinterpretar" o regulamento -não pensaram antes no que estavam assinando. Vale-lhes a lição: média -é preciso saber escolher a mais conveniente...)

*Antonio dos Santos Machado é professor de matemática do Curso Intergraus

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